segunda-feira, 22 de junho de 2015

1967 - Geraldo Vandré - Canto Geral



"Desses tempos em que falar de árvores é quase um crime, pois implica em silenciar sobre tantos erros - aos que virão depois de mim."

BERTOLD BRECHT

A comunicação (não confundir com massificação) é para nós o objetivo fundamental de qualquer trabalho em arte. A invenção e a elaboração somente transcendem seus aspectos puramente formais e passam a ser efetivamente criativas quando servem a uma necessidade real e concreta de repartir. Sem bondades e sem heroísmos.

Por uma decorrência natural de ser e de ter. Porque repartir é, em última análise, um exercício fundamental da existência e a única razão de ser da propriedade.

Construindo casas ou pontes, igrejas ou hospitais, pintando, curando doentes, voando ou varrendo as ruas, fazendo política ou amor, morrendo e, porque não, matando, a vida importa somente pela doação que se faz dela, pelo sentido e pela direção. Às vezes penso que cantando mereço um pouco a vida. Saldo em parte os meus compromissos e tenho então, cada vez mais forte, a impressão da liberdade. Por isso aprendo a cantar e canto.

Neste disco a palavra Geral tem de mim somente uma vontade muito grande de colocar-me sem pudores com o instrumento da comunicação de tudo que aprendi a ver, ouvir, pensar e sentir a respeito do meu tempo, do meu lugar e da gente que vive neles. A palavra Geral tem ainda o sentido de reconhecimento público de devo a algumas pessoas cujo trabalho de dedicação profissional tornaram possível a sua realização. São elas: Osvaldo Gurzoni, Orlando Stephano e Maestro Peruzzi, diretores da ODEON em São Paulo. Moacyr Rocha, diretor de Arte, também da ODEON em São Paulo, que juntamente com George Torok e Fernando Lemos, ambos da Maitiry, nos deram a apresentação gráfica, Nivaldo Duarte pelos cuidados, pelo gosto e os resultados no som das gravações. Edgar e Marconi, responsáveis pelo som fundamental da viola caipira ou brasileira como queiram. Cleon no que há de oboé e corne inglês.

Nosso reconhecimento e gratidão são finalmente para Bering pelo canto, pelo ca-chi-chi, pelo tan-tan, pela queixada de burro, pelo reco-reco e pelo triângulo. Para Marconi pelo canto, pela viola, pelo tan-tan, pelo pau e pela chama e pelos arranjos instrumentais. Para Hilton pelo canto, pelo violão, pelos arranjos vocais, pelas canções que fez comigo e pela lealdade maior do melhor amigo. Para o Trio Marayá, que soma Bering, Marconi e Hilton, pela consciência e entrega sem limites no trabalho. Pelas brigas, pelas discussões, pela compreensão com os meus defeitos maiores e menores, pela teimosia nordestina e pelo amor à terra e a sua gente.

O sentido da palavra Geral depende, afinal, do acerto no trabalho. Das notícias e das emoções que ele pssa trazer a cada um de nóis e principalmente do uso que faremos delas.

É possível que este disco tenha custado a mim mesmo e a outras pessoas mais do que esperávamos, do que gostaríamos ou do que seria justo que custasse. Mas eu tenho uma boa explicação: os critérios de justiça do mundo em que vivemos ainda estão muito longe de poder dar-nos a certeza e uma garantia mínima do que seja verdadeiramente justo ou injusto.

GERALDO VANDRÉ - Março de 1968

PS - "Vós que Vireis na crista da onda em que nos afogamos, quando falardes de nossas fraquezas pensai também no tempo sombro a que haveis escapado"

BERTOLD BRECHT



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